
"Falei para o meu filho ser forte e disse que a mãe dele havia partido".
Consolar o filho foi a primeira atitude que o segurança Izaías Vicente de Oliveira teve ao saber da morte da mulher, a servidora pública Lidiane Aparecida Fernandes Oliveira, de 39 anos, após ter sido submetida a procedimentos estéticos no Instituto Mineiro de Obesidade (IMO), no bairro de Lourdes, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte.
Os procedimentos – abdominoplastia e lipoaspiração – começaram às 8h30 e terminaram às 13h da última segunda-feira (6). A morte foi constatada no Hospital Vera Cruz, também na Região Centro-Sul, na madrugada desta terça-feira (7).
Izaías e Lidiane eram casados havia 17 anos e tinham três filhos.
Para a reportagem, Izaías falou de "falta de assistência" e lembrou dos momentos de aflição até a confirmação da morte da mulher.
Por volta de 1h20 da madrugada da terça (7), já no Hospital Vera Cruz, Izaías e um dos filhos subiram ao quarto e puderem ver Lidiane. Nesse momento, ele percebeu que a mulher estava com o rosto inchado e que o corpo estava frio.
"Passei a mão na perna, nos braços, e estavam gelados. O pé estava branco", disse.
Izaías então questionou o médico responsável pela cirurgia, Lucas Mendes, que estava no hospital, sobre o estado de saúde de Lidiane.
"Ele abaixou a cabeça e fez uma cara meio feia, como se quisesse esconder alguma coisa".
Foi aí que o segurança percebeu que a esposa estava sem vida.
Com a notícia, o filho se desesperou e saiu correndo pelo hospital. Izaías foi atrás. Depois, ele tentou encontrar o médico novamente, mas não conseguiu mais. "A equipe do hospital o escondeu. Ele saiu pelos fundos", disse.

Médico lamenta morte
Em nota, o cirurgião plástico Lucas Mendes disse: "Perder uma paciente dessa forma foi e está sendo muito difícil para mim. Nenhum médico acorda de manhã para trabalhar com o objetivo de causar mal ao seu paciente".
Ele disse ainda que esteve "ao lado da família a todo momento no hospital Vera Cruz". "Não consigo mensurar o luto dos familiares e amigos".
"Algumas informações sobre o ocorrido e a paciente não tenho o direito de mencionar na mídia, pois tenho que respeitar o sigilo da relação médico-paciente. Quando os familiares estiverem se sentindo um pouco melhor, se for o desejo deles, estarei a disposição para conversar", disse.

'Não tínhamos informação'
O segurança foi o responsável por levar a mulher até a clínica e ambos chegaram lá às 7h20 de segunda-feira (6). Pouco mais de 20 minutos depois, Lidiane entrou na sala de cirurgia e ele foi até a casa de uma prima dela depois de a equipe informar que o procedimento estético duraria entre quatro e cinco horas.
Lidiane se submeteu a duas cirurgias plásticas, sendo uma abdominoplastia e uma lipoaspiração.
"Às 13h, não tínhamos informação. Falei com a minha cunhada, que ligou para lá. Disseram que poderíamos ir porque ela já estava na sala de recuperação", lembrou.

Ao chegar à clínica, a cunhada subiu para o quarto e Izaías foi na sequência. Ele encontrou a esposa, que estava com muitas dores. O segurança questionou as técnicas de enfermagem, que informaram que era uma situação normal em virtude da diminuição dos efeitos dos sedativos. As profissionais também disseram que iriam medicá-la.
Depois, ele saiu da clínica e ficou um pouco do lado de fora. Por volta das 18h, retornou para Brumadinho, onde mora a família. "Pouco depois de chegar em casa, minha cunhada me ligou pedindo para voltar com a carteira do plano de saúde".
Ele então voltou para BH com o filho, de 15 anos. A essa altura, Lidiane já havia sido transferida para o Hospital Vera Cruz, na região Centro-Sul.
Como não sabia onde era o hospital, Izaías e o filho foram à unidade hospitalar acompanhados da sogra do filho. "Minha cunhada me contou que ela foi transferida para o hospital porque sofreu uma parada cardíaca na clínica".
Foi no hospital Vera Cruz que a aflição começou.
"Cheguei ao hospital por volta das 20h. Até as 22h, fiquei sem notícias, lá fora, igual doido. Às 23h, fui ao porteiro e perguntei se tinham feito a ficha. Eles disseram que não porque estavam esperando o convênio liberar", relatou.
Foi quando Izaías pediu para falar com a equipe da unidade de saúde e disse que chamaria a polícia e registraria uma ocorrência.
Nesse momento, segundo Izaías, o cirurgião Lucas Mendes apareceu e os conduziu, juntamente com uma técnica do hospital, para uma sala.
"Ele disse: 'Infelizmente tem que esperar. O que foi feito do ponto de vista da medicina, já fizemos'". O segurança então questionou a falta de estrutura no IMO e pediu para ver a esposa. "Ele não me deixou. Pediu que eu aguardasse. Disse que ia vê-la e depois iria me autorizar".
Polícia e CRM apuram
A Polícia Civil e Conselho Regional de Medicina investigam a morte da servidora pública.
O Conselho Regional de Medicina do Estado de Minas Gerais (CRM-MG) disse que "tomou conhecimento por meio da imprensa de morte de paciente após realização de lipoaspiração e abdominoplastia na cidade de Belo Horizonte e que iniciará os procedimentos regulamentares necessários à apuração dos fatos".
"Todas as denúncias recebidas são apuradas de acordo com os trâmites estabelecidos no Código de Processo Ético Profissional (CPEP), tendo o médico amplo direito de defesa e ao contraditório."
No site do CRM, consta que o médico tem situação regular, ou seja, está apto a exercer a função. Ele tem especialidades em cirurgia geral e cirurgia plástica.
A Polícia Civil apenas informou, sem mais detalhes, que o caso está sob investigação.
O médico informou aos militares que não pertence à clínica e que apenas usou a estrutura da clínica para realizar a cirurgia em Lidiane. O instituto não possui Centro de Terapia Intensiva (CTI).
A Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, informou que "a Clínica IMO – Instituto Mineiro de Obesidade, possui Alvará de Autorização Sanitária para realização de cirurgias plásticas e atende aos requisitos legais da legislação".
"O alvará sanitário é válido até outubro de 2023. Portanto, em relação à Vigilância Sanitária, a clínica se encontra regularizada".
O que diz Instituto
Em nota, o Instituto Mineiro de Obesidade disse que "não é uma clínica de estética, mas sim um hospital dia focado em procedimentos e emagrecimento, não exercendo pessoalmente qualquer atividade relacionada a procedimentos de cirurgia plástica. Os procedimentos de cirurgia plástica são exercidos por médicos que não integram o corpo clínico do hospital".
A reportagem entrou em contato com o médico responsável pelo instituto e com assessoria do hospital Vera Cruz, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.
Prefeitura de Brumadinho lamenta
Lidiane era servidora pública da Prefeitura de Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A prefeitura lamentou a morte da mulher.
"A Prefeitura e a Secretaria de Saúde lamentam profundamente o falecimento de Lidiane Aparecida Fernandes Oliveira. Profissional zelosa, atenciosa e muito querida pela equipe do Complexo Hospitalar Valdemar de Assis Barcelos. Enviamos as nossas condolências aos amigos e familiares".